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Agentes químicos são 'arma' para combater novo coronavírus


texto: Ana Margalho / foto: DR / Legenda: Clemente Pedro Nunes é professor catedrático do Instituto Superior Técnico, com doutoramento em Engenharia Química Terça, 24 de Março de 2020

“É fundamental que haja protocolos agressivos de limpeza e desinfecção de hospitais, centros de saúde e também os centros de análise e ‘drive-in’ onde se estão a realizar testes [de detecção de infecção pelo novo coronavírus] sob pena de estarmos a transformá-los em autênticas bombas biológicas”.
O alerta é de Clemente Pedro Nunes, professor catedrático do Instituto Superior Técnico, com doutoramento em Engenharia Química, que, em declarações ao Diário de Leiria, considera “absolutamente necessária a descontaminação com qualquer agente biocida” dos espaços onde circulam doentes, mas também das ruas e habitações “em que tenha circulado recentemente muita gente infectada”.
Sublinhando as características deste novo coronavírus, que tem “uma resistência física absolutamente única” e permanece em certas superfícies durante dias, como o comprovam várias experiências científicas mundiais, Clemente Pedro Nunes concorda que “é fundamental o reconhecimento das forças” deste vírus, mas defende uma atenção especial das autoridades de saúde e políticas, nomeadamente das autarquias, para o que chama a sua maior “fraqueza”, que é o facto de ser “muito vulnerável, ou pelo menos tão vulnerável como os vírus mais vulgares da gripe” aos agentes químicos.
Justifica-se, por isso, de acordo com o especialista, a criação dos tais “protocolos muito agressivos” de limpeza das “zonas, salas, edifícios e ruas altamente contaminadas”, que espera que existam e estejam a ser cumpridos, nomeadamente em unidades de saúde e locais de realização de testes, para que não sejam estes agentes de propagação do novo coronavírus.
“O isolamento social directo elimina 85% da cadeia de transmissão, mas este tem de ser complementado com o uso de agentes químicos que eliminem o vírus”, afirmou. E aqui, “o mais barato e eficaz é a lixívia de hipoclorito de sódio”, avança o professor catedrático.
“Trata-se de uma verdadeira descontaminação profiláctica, própria de uma guerra biológica”, diz Clemente Pedro Nunes, defendendo como fundamental - além do uso do que chamou “armas químicas” - que sejam testados, não só todo o pessoal hospitalar, mas também os doentes que dão entrada nos hospitais, seja qual for a sua patologia.
“Ninguém nos garante que uma pessoa que entre numa urgência com uma pedra no rim ou que um jovem que ficou ferido num acidente, não esteja já infectado, mesmo que assintomático”, exemplifica o engenheiro químico, convicto que só com a conjugação de todas estas variáveis é possível vencer esta guerra que, como já se viu, tem várias frentes.

Indústria e Ciência
têm de estar envolvidas

E, no que respeita a conjugação de forças, o especialista considera igualmente indispensável que “Portugal se mobilize para analisar a questão científica, tecnológica, de produção industrial, mas também de engenharia e química” envolvente a esta pandemia, “de modo a conseguir optimizar meios” para responder às necessidades, nomeadamente ao nível da produção de testes e de equipamentos de protecção individual, mas também de ventiladores.
“Este tempo exige a mobilização da indústria, com a CIP [Confederação Empresarial de Portugal] na primeira linha”, afirmou Clemente Pedro Nunes. “Para isso, é preciso que, em termos da necessária cadeia produtiva, haja um maestro, alguém que coordene, que deveria ser a CIP e o ministro da Ciência, Tecnologia e do Ensino Superior ou alguém que ele indique, a fim de mobilizar os recursos tecnológicos, produtivos e logísticos necessários ao sucesso nesta ‘guerra’ em curso”, afirmou, lamentando, por isso, a ausência de Manuel Heitor, ou de um secretário de Estado daquele ministério, no gabinete de crise da Covid-19 “para ajudar a tomar decisões de base científica e tecnológica”. “No gabinete de crise há cinco juristas e um economista. Não se percebe”, desabafa.
Aliás, o especialista aproveita para defender que o Governo disponibilize à comunidade científica os dados já existentes sobre a Covid-19 em Portugal, por considerar “fundamental que esta pandemia seja analisada, em tempo real, e dela sejam tiradas conclusões estratégicas, que conduzam a actuações o mais eficazes possíveis”.



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