
‘Madrugada’ mostra manhã de 25 de Abril e lança perguntas para futuro
Que prisões ainda restam é uma das questões deixadas na ópera ‘Madrugada’, em cena na sexta-feira, no Teatro José Lúcio da Silva, em Leiria, retratando momentos da vida portuguesa como a madrugada do 25 de Abril de 1974.
Iniciativa do Movimento Patrimonial pela Música Portuguesa (MPMP), com libreto de Marta Pais Oliveira, a ópera contemporânea retrata quatro momentos da vida em Portugal: 1942, quando Ferreira Soares, conhecido em Nogueira da Regedoura (Santa Maria da Feira) como o médico dos pobres, terá sido assassinado à queima-roupa pela então Polícia de Vigilância e Defesa do Estado (PVDE), a madrugada do 25 de Abril, a atualidade, e uma data projetada no futuro algures em 2077.
Estreada em abril no Teatro das Figuras, em Faro, a ação do espetáculo decorre num único dia retratando quatro momentos - noite, madrugada, manhã e tarde -, com o início a dar-se de noite, numa alegoria à “escuridão” que tingiu Portugal durante a ditadura do Estado Novo, disse à agência Lusa a encenadora da ópera, Daniela Cruz.
O espetáculo “parte de uma vontade de criar uma ópera contemporânea que se passa em quatro cenas, cada uma reportando-se a um período temporal, começando em 1942 e terminando em 2077", observou. A partir de histórias menos conhecidas - do tempo do fascismo ou da Revolução dos Cravos, que “não foi feita sem sangue, já que morreram quatro civis manifestantes”, a ópera percorre vários tempos sem que a democracia fique “totalmente consolidada”, acrescentou Daniela Cruz.
“Quando imaginámos esta ópera a partir da liberdade e da democracia, que é um ensaio, pois ainda há muita coisa por fazer, pensámos 2077 como referência a estes movimentos que ainda estão por criar. Avançamos muita coisa, já melhoramos e já conquistamos muitas coisas, mas ainda há movimento por criar”, frisou.
E é essa a mensagem deixada na quarta cena da ópera, que se passa no futuro e que, embora “não seja tão relevante em termos de data como as outras para trás, aponta o futuro como um lugar com mais liberdade”.
Um lugar “com mais espaço para dançar, onde se criam movimentos. Na ópera é, realmente, a altura em que existe mais espaço para o movimento, para a dança, onde todos dançam e onde todos têm mais espaço”, concluiu a encenadora, remetendo para a personagem do espetáculo Dançatriz, a única que atravessa os quatro momentos da ópera.
Uma personagem “otimista, alguém que vê o passado e se projeta para o futuro e que ao longo da ópera vai ganhando espaço para o movimento dela”.
Com música escrita e composta a oito mãos - Carlos Lopes, Sara Ross, Francisco Fontes e Solange Azevedo – “Madrugada” inclui ainda um coro comunitário, na senda “do espírito de abril”, referiu a encenadora.
Com direção artística de Jan Wierzba e encenação e coreografia de Daniela Cruz, ‘Madrugada’ subirá ao palco do Teatro José Lúcio da Silva, também com a Filarmonia das Beiras. |